sexta-feira, dezembro 29, 2006

O Professor Jacinto Rodrigues apresenta o Padre Himalaya


Numa curta entrevista de cerca de cinco minutos, o Professor Jacinto Rodrigues, em entrevista à 66TV (televisão dos Pirinéus orientais) fala da vida e obra do Padre Himalaya... Para visualizar basta "clicar" na imagem que ilustra este artigo.
Recordo que
aqui (clicar) havíamos falado no Padre Himalaya e publicado uma entrevista que o Professor Jacinto Rodrigues facultou ao Portal das Energias Renováveis.
Quanto à imagem, trata-se do "Pyrheliophero", pioneira máquina solar com que em 1904 o Padre Himalaya recebeu o Grande Prémio da Exposição Universal de St. Louis, nos Estados Unidos da América.
(Fotografia obtida do livro "A Conspiração Solar do Padre Himalaya" de Jacinto Rodrigues, Porto, Edição da Cooperativa Árvore, 1999)

sexta-feira, dezembro 15, 2006

"Glosa de Natal"...


Para além de ser absolutamente imprescindível pensar (ou repensar) a época natalícia e os impactos que ela tem neste nosso mundo cada vez mais vilependiado, talvez também não seja mau recordar que, afinal, o personagem cujo nascimento agora mais uma vez se venera, era palestiniano, descendente de judeus... e pobre. Não me consigo, assim, impedir de publicar o maravilhoso texto de Marguerite Yourcenar, intitulado precisamente:

"Glosa de Natal"
“A estação dos Natais comercializados chegou. Para quase toda a gente - fora os miseráveis, o que faz muitas excepções - é uma paragem quente e clara no Inverno cinzento. Para a maioria dos celebrantes de hoje, a grande festa cristã fica limitada a dois grandes ritos: comprar, de maneira mais ou menos compulsiva, objectos úteis ou não, e empanturrar-se a si e às pessoas da sua intimidade, numa mistura indestrinçável de sentimentos em que entram igualmente a vontade de dar prazer, a ostentação e a necessidade de se divertir. E não esqueçamos os pinheiros, símbolos antiquíssimos que são da perenidade do mundo vegetal, sempre verdes, trazidos da floresta para acabarem morrendo ao calor dos fogões, e os teleféricos despejando esquiadores na neve inviolada.
Embora não sendo nem católica (excepto de nascimento e de tradição), nem protestante (excepto por algumas leituras e influências de alguns exemplos), nem mesmo cristã no sentido pleno do termo, nem por isso me sinto menos levada a celebrar esta festa tão rica de significados e seu cortejo de festas menores, o São Nicolau e a Santa Lúcia do Norte, a Candelária e os Reis. Mas limitemo-nos ao Natal, esta festa que é de nós todos. Trata-se de um nascimento, de um nascimento como todos deveriam ser, o de uma criança esperada com amor e respeito, trazendo em si a esperança do mundo. Trata-se dos pobres: uma velha balada francesa canta Maria e José procurando timidamente em Belém uma hospedaria para as suas posses, sempre desprezados em favor de clientes mais ricos e reluzentes e por fim insultados por um patrão que «detesta a pobralhada». É a festa dos homens de boa vontade, como dizia uma admirável fórmula que infelizmente já nem sempre se encontra nas versões modernas dos Evangelhos, desde a serva surda-muda dos cantos da Idade Média que ajudou Maria no parto até ao José aquecendo as fraldas do recém-nascido diante de um pequeno fogo, aos pastores cobertos de sebo mas julgados dignos da visita dos anjos. É a festa de uma raça tantas vezes desprezada e perseguida, porque é judeu o recém-nascido do grande mito cristão (falo de mito com respeito, e emprego a palavra no sentido dos etnólogos modernos, significando as grandes verdades que nos ultrapassam e de que precisamos para viver).
É a festa dos animais que participam no mistério sagrado desta noite, maravilhoso símbolo de que São Francisco e alguns outros santos sentiram a importância, mas que os cristãos comuns desprezam, não procurando neles inspiração. É a festa da comunidade humana, porque é, ou será dentro de dias, a dos três Reis cuja lenda quis que um fosse preto, alegoria viva de todas as raças da Terra levando ao menino a variedade dos seus dons. É a festa da alegria, mas também da dor, pois que a criança adorada será amanhã o Homem das Dores. É enfim a festa da própria Terra, que nos ícones da Europa de Leste vemos tantas vezes prosternada à entrada da gruta onde o Menino nasceu, a mesma Terra que na sua marcha atravessa neste momento o ponto do solstício de Inverno e nos arrasta a todos para a Primavera. Por esta razão, antes que a Igreja tivesse fixado o nascimento de cristo nesta data, ela era já, nos tempos antigos, a festa do Sol.
Parece que não é mau lembrar estas coisas que toda a gente sabe e que tantos esquecem.”

Marguerite Yourcenar em: “ O tempo esse grande escultor” - 1976

(Para ver algumas soluções para "um Natal mais cristão" clicar na imagem e aceder a www.buynothingchristmas.org)

segunda-feira, dezembro 04, 2006

IX Congresso Luso-Afro-Brasileiro


Em torno do IX Congresso Luso-Afro-Brasileiro, que decorreu em Luanda entre os passados dias 28 a 30 de Novembro, nasceu o "blogue" "Esteira do Ambiente", para o qual passamos a partir deste momento a fazer uma ligação. O primeiro texto a dar o mote, chama-se "Um colibri em cada lugar" e nasceu da colaboração dos vários intervenientes no painel "Ecologia e Meio Ambiente" deste Congresso.

segunda-feira, novembro 13, 2006

Semana Nacional da Agricultura Biológica


Nos últimos anos os produtos da agricultura biológica têm vindo a ganhar importância, reconhecimento, dimensão e excelentes perspectivas de futuro em toda a União Europeia, mas continuam a ser pouco e mal conhecidos pela generalidade dos consumidores portugueses que, em boa parte, ignoram como podem contribuir para a sua saúde, para o seu bem-estar, para o ambiente equilibrado e o crescimento sustentável dos seus países e para o futuro dos seus filhos.

Por isso a Interbio – Associação Interprofissional para a Agricultura Biológica – decidiu organizar entre 18 e 26 de Novembro próximo a primeira Semana Nacional da Agricultura Biológica – semana bio – dedicada aos consumidores.

quinta-feira, novembro 09, 2006

Joseph Beuys - Um Filósofo na Arte e na Cidade

Por Jacinto Rodrigues (professor catedrático da Faculdade de Arquitectura da Universidade do Porto)

Muita gente, em Portugal, desconhece a vida de Joseph Beuys. E aqueles que conhecem a sua obra, conhecem-na desligada de todo o contexto em que foram criadas. As obras expostas nas galerias e nos museus não passam de cadáveres das "Acções" cujo sentido tem sido ocultado e apagado pelos críticos formalistas que tomam a nuvem por Juno. As suas obras pictóricas ou as suas esculturas, as suas instalações eram apenas pretextos para a criação de foruns para debates.
A sua "arte feia" é uma espécie de contra-imagem, geradora de evocações simbolizadas pelos objectos expostos. O artista é o sujeito capaz de evocar o significado, apenas grosseiramente enunciado por aquele simples expediente com que toda a gente pode provocar a arte nos outros, ou seja, viver criativamente a vida "desocultando" o que está apenas escondido. Com materiais e instalações simples, pretende provocar interpretações simbólicas e culturais singulares, reacções de todos os que são capazes de construir a visão artística do que apenas foi enunciado.
O "artista" fazedor apaga-se para enaltecer o artista decifrador, que ocupa agora o lugar na divina criação daquilo que foi apenas a modesta aparência ou sombra da realidade que é a vida quotidiana. Trata-se da inversão do mito da caverna de Platão. Antigamente o artista era o personagem que, através do "ícone sublime", fazia aparecer a divindade no público considerado como incapaz de comparticipar da beleza dos deuses, própria aos divinos artistas. Agora, trata-se de uma demissão do papel divino do fazedor de arte, para que caiba aos outros o papel de criadores autónomos. Mas não se pretende apenas essa reviravolta do sujeito objecto. Trata-se agora da possibilidade de toda a gente poder participar neste duplo jogo de produzir e usufruir da arte, transpondo este passo que separa o artista do não artista.
Dantes, a arte fazia consumir um imaginário totalmente elaborado pelo artista, obrigando o fruidor a delimitar-se a uma proposta definida.
A artisticidade de Beuys é o quotidiano, acessível a toda a gente, processo contínuo, obra aberta para todos os imaginários que na participação, no debate e na acção solidária vão criando mudança de vida.
Percebendo a fundamentação do seu pensamento e reconhecendo a autenticidade da sua vida, podemos compreender melhor o alcance da sua obra.
A guerra representou, certamente, na sua vida um elemento central. Beuys, ele próprio, "designou o tempo de guerra uma experiência cultural e como artista pôde incorporá-la na sua obra" (in Joseph Beuys -Heiner Stachelhaus -ParsifalEdiciones, Barcelona 1990).
Primeiramente, a situação de suportar uma guerra como um destino na frente militar. Soldado raso, não queria submeter-se às regras de obediência, porém, obrigado pela "máquina de guerra", enfrentou a experiência da morte. No Inverno de 1943, como telegrafista num bombardeiro de combate, teve um acidente. O avião depois de atingido pelos canhões antiaéreos de uma base russa, despenha-se na Crimeia, durante uma tempestade de neve. Beuys é o único sobrevivente. Está gravemente ferido. Uma fractura craniana, costelas, pernas e braços partidos.
Quando está à beira de morrer, um grupo de tártaros nómadas, que transitavam por esse lugar, acolhem-no. Cobrem-no primeiro de gordura e aconchegam-no depois com panos de flanela. E, num ambiente mágico, os "chamanes" da pequena tribo de nómadas curam-no milagrosamente. Beuys vivencia essa presença "chamánica" como algo de exemplar e significativo para a sua vida e obra. Daí a importância constante da gordura e do feltro, materiais com os quais os "chamanes" o envolveram para o curarem das queimaduras e traumatismos sofridos com o acidente. Daí a constante atitude de profundo respeito pela natureza e pela espiritualidade cósmica.
A relação com a tribo nómada quase o leva a optar por ficar para sempre nesse grupo de tártaros. Porém, para Beuys, a ligação à natureza não é chamánica. É uma espiritualização do futuro, como na antroposofia que subjaz à sua formação. A pesquisa espiritual de Beuys não procura no passado. Integra o passado espiritual num projecto de futuro. Uma espiritualidade consciente e não atávica; não adquirida mas construída... Ultrapassar o irracional e o racional, através de uma procura em que o "oculto" se torna "manifesto".
Assim, o destino é outro. A sua ligação com a natureza, com a fauna e a flora vai agora mais longe. Não são apenas os estudos que fizera, ainda rapaz no Alto Reno, que constituem a sua formação científica.
Em 1941, Beuys com 20 anos, toma conhecimento da obra de Rudolf Steiner, através do seu amigo Fritz Rothemburg que viria a morrer no campo de concentração de Gachsennhausen, em 1943. Joseph Beuys frequentou os grupos de antropósofos em Dusseldorf. Por essa altura retém a ideia da "unidade na multiplicidade", dos quatro níveis do homem: corpo físico, corpo etérico, corpo astral e o "Eu". A relação que estabelece com a natureza vai marcar a influência da antroposofia de Steiner.
A abelha e a lebre são imagens plásticas na sua obra que se referenciam à gordura e ao feltro, da sua experiência durante a guerra e que integram a polaridade metabolismo e neuro-sensorial na filosofia de Steiner .
Também o "conceito ampliado de arte", a plástica ou a "escultura social", traduzem uma ideia latente na problemática estética de Rudolf Steiner - arte como totalidade da vida. E ainda, a perspectiva de que "cada homem é um artista" sublinha a estratégia pedagógica de Rudolf Steiner, que ao fundar o movimento das Escolas Livres Waldorf, pretendia uma formação que integrasse a actividade artística como elemento essencial do programa curricular.
Joseph Beuys ao fundar ainda a "Universidade Livre Internacional" procurou através das "acções" e "instalações", organizar um movimento que, para além de uma estratégia cultural, articulasse os princípios da tripartição social de Steiner: liberdade total ao nível da cultura e aspirações espirituais, igualdade jurídica ou idênticas oportunidades sociais e fratemidade económica ou cooperação nas necessidades vitais.
Este relacionamento de Joseph Beuys com a antroposofia não é isento de controvérsia. Beuys tem um pensamento próprio sobre o olhar e a reflexão que integra na construção da sua própria pessoa.Estão presentes na sua concepção, muitas outras influências, tais como Kierkegaard, Nietzche e Marx. Ainda como influência literária na sua vida é patente a presença de Goethe/Schiller, Hoderlin, Novalis. Na arte, nota-se a marca do escultor Wilhelm Lehmbruck e do pintor Eduard Munch.
As colecções de botânica e ainda os conhecimentos que obteve no contacto pessoal com Heinz Sielmann (que veio a ser célebre cineasta da natureza e colaborador do etologista austríaco Konrad Lorenz) tomaram-no um profundo conhecedor da ecologia. E este conhecimento vai desenvolver-se ao longo da sua vida. Fundador do movimento dos verdes ele pretende imprimir a este grupo não apenas um papel político em estrito senso mas considerar a ecologia como mais do que defesa do ambiente. Transformar a política em arte. Daí a arte alargada como intervenção social. "Este conceito alargado da arte revoluciona não somente os conceitos burgueses da arte e da ciência materialista, mas renova também a actividade religiosa" (in "Joseph Beuys", Há Vinh Tho, Ed. Triades, 1991).Beuys organizou várias acções culturais que expressam toda esta nova filosofia de arte que defendeu. Vamos dar alguns exemplos:
O "Das Kapital Raum" (1970/77) pretende ser um processo itinerante de desencadear múltiplas acções em vários locais.
Estas acções contêm várias formas de intervenção: Foruns que levam a debates participados e a decisões assumidas em democracia directa, tendo em vista a transformação da vida cultural e urbana. Trata-se de uma exposição portadora de múltiplas mensagens. Compreender esta exposição é entender um processo que caracteriza a atitude filosófica de Beuys.
Em primeiro lugar é uma exposição que se metamorfoseia nos vários modos como vai transitando no tempo e nos vários locais onde é apresentada. "O acto criador é uma inspiração única e singular que pertence ao momento presente.
E é por isso que não pode ser simplesmente repetida" (Beuys in idem). Estabelece uma relação de alternativa aos museus que albergam a própria exposição. "O museu é laboratório" (in Beuys -Das Kapital Raum, Franz Joacquim Verspohl, Ed. Adam Biro, Paris, 1989), porque experimentará novas formas de articulação de artisticidade em mudança e que aspira a não ficar emparedada. Precisa, no entanto, de referências ou receptáculos mutáveis para encetar ambiguidades, conflitualidades e polaridades que a tornem visível porque a arte social, defendida por Beuys, é movimento, metamorfose e vida.
A sua exposição toma-se itinerante e nunca se mantém igual. Evolui em cada exposição. Opõe-se à função museológica tradicional, pois não pretende mostrar a obra estática e acabada! Mostra instrumentos, explicita um "atelier" de intervenção cultural: há um conjunto de painéis, sinais e diagramas. Há uma mostragem de objectos quotidianos: uma banheira de zinco onde Beuys lavará os pés a alguns dos visitantes da exposição, numa das acções que desenvolveu. Procura aí, "cristicamente", agradecer e enaltecer a fraternidade daqueles que lhe dão a importância de participarem na acção que propôs, como na referida exposição anti-museológica, iniciada no museu suíço de Zurique.
Existem ainda gravadores, machados e um piano. Beuys explicita essencialmente o processo instrumental e não a obra acabada E, com a intervenção pedagógica, estes instrumentos tornam-se operativos nos múltiplos "happenings".
Num outro exemplo de "performance", nos Estados Unidos da América, - "Coyote. I like America and America likes me" - Beuys procura articular vários arquétipos, para estabelecer sinais com significado profundo. O coiote é um pequeno lobo, símbolo mágico dos índios da América. Ao encerrar-se num espaço fechado em que procura o diálogo com o animal selvagem, ele estabelece uma ponte entre o "cão e o lobo" que se encontram no coiote e também no próprio homem. Esta performance permite revelar a possibilidade de conectar as rupturas e de as "sanar" mostrando que o paradoxal não é destituído de sentido. Ao contrário, o paradoxo manifesta o real que é contraditório, em busca da criação através do jogo, do humor e do amor.
Beuys afirma o conteúdo fundamental da sua mensagem artística desta maneira:

"Cada homem é um artista - a estética é o ser humano";


"Deve haver uma relação entre o criador e o que usufrui - viver é criar com e para a humanidade".

"Conceito ampliado de arte - arte é a vida".

"Deus e o mundo são arte - arte é ciência e ciência é arte".

"O uno é o múltiplo e o múltiplo é o uno."

Nestes simples aforismos, explicita-se a sua filosofia de arte e de vida.
Por isso Beuys considera que "a criatividade não é monopólio das artes. (...) Quando eu digo que toda a gente é artista eu quero dizer que cada um pode concentrar a sua vida nessa perspectiva: pode cultivar a artisticidade tanto na pintura como na música, na técnica, na cura de doenças, na economia ou em qualquer outro domínio... A nossa ideia cultural é muitas vezes redutora. O dilema dos museus e das instituições culturais é que limitam o campo da arte, isolando-a numa torre de marfim (...). O nosso conceito de arte deve ser universal, terá que ter uma natureza interdisciplinar com um conceito novo de arte e ciência" (1979 - entrevista com Franz Hak).
Vale a pena explicar ainda outras acções paradigmáticas que Beuys levou a cabo.
Em 1982, em Kassel, faz uma exposição como "pretexto" para o desenvolvimento de uma "acção". Após uma longa discussão sobre o homem e a árvore, onde se abordam múltiplas aproximações, desde a mitologia à antropologia e ecologia, Beuys e as várias dezenas de pessoas plantam 7000 castanheiros. "Plantando árvores, as plantas plantam-se também em nós. Assim coexistimos, sendo um no outro".
Ainda na América, Beuys passa várias horas na tenda de um índio revelando solidariedade e uma profunda compreensão antropológica pelas minorias encerradas nas reservas americanas.
Durante um comício de ecologistas, faz uma escultura com o papel proveniente dos panfletos e cartazes que pejavam o chão, onde se realizou o comício. Mostra assim que não bastam estratégias formais de afirmação de uma vontade de mudança. … preciso que no modo de fazer a mudança se manifeste exemplarmente o significado pretendido pela mudança. Essas acções têm de ser acções exemplares, acções que tocam nos arquétipos mais fundos do ser humano. "Acções" que mobilizam energias de vontade, que implicam sensibilidade e propõem a lucidez na estratégia. Durante uma manifestação contra a poluição em 1971, Beuys nada na zona poluída de Zuinder Zee. É um acto sacrificial como uma greve de fome ainda mais gritante ou talvez a ternura pela natureza doente. É uma natureza que morre por nós! Um acto, afinal, de compaixão mas de terrível apelo à consciência da comunidade para dizer que a morte de um lago é mais importante do que a simples morte de um homem.
Utilizando os dotes de professor e orador, mimo e músico, Beuys imprimia às suas "acções" uma notável clareza demonstrativa das suas ideias. E, com os recursos estéticos da sua criatividade, procurava na música, na cor e na teatralização, a força rítmica e criadora de um processo social: "A arte não reside no resultado material saído do processo artístico; na tela ou na escultura, mas na tomada de consciência do potencial criador que se manifesta nessa ocasião. A atenção deve afastar-se do objecto, para se encontrar sobre a actividade interior da alma durante o acto criador" (in Tríades 1991, Paris, Há Vinh Tho).
Joseph Beuys foi, durante a sua própria vida, sujeito a opiniões contraditórias. Deixou-nos, porém, a sua vida singular como testemunho de uma arte original. Os objectos que ele legou, alguns vendidos agora a peso de ouro, as aguarelas ou os "objectos", pretextos pedagógicos das suas "acções culturais", estão expostos em museus e galerias de todo o mundo.
Embalsamaram talvez a vida própria das suas criações. Mas, ao mesmo tempo, perpetuaram paradoxalmente memórias que continuam subversivas quando decifradas novamente.
O movimento, o fluxo da sua vida e a metamorfose da sua arte nas múltiplas acções colectivas a que chamou arte social, tinham que ver com a sua figura de chapéu de feltro, com uma voz forte e os gestos de um actor , lançando a força mágica e criativa da sua mensagem: criar com e para os outros!
Essa voz e esses gestos continuam, mesmo depois da sua morte em 23 de Janeiro de 1986, em Dusseldorf. É que a força seminal do seu projecto não se esgotou no seu tempo.
Beuys é um Max Stirner da estética. A sua postura e a filosofia da sua arte, exigem uma subversão ontológica de conceitos e de atitudes. Exigem processos de ruptura culturais e civilizacionais que estão a ser abalados com a transição do paradigma em que vivemos.
A questão ecológica, assim como a consciência planetária que a população está em vias de consolidar em torno de uma nova solidariedade gerada paradoxalmente pelo egoísmo da globalização neo-liberal, concentracionária e destruidora da biosfera, é a base objectiva e alargada para dar corpo ao pioneirismo de Joseph Beuys.
No ano passado, 2000, em Baltimore, começaram as plantações no Patterson Park e no Carrol Park, com voluntários, apoiados pelos alunos e alguns professores da Universidade e do Centro de escultura social de Minneapolis. Trata-se da conquista e transformação de espaços públicos.
Este movimento de modificação da paisagem com árvores, é uma intervenção participada da sociedade civil. É a tradução dessa nova forma alternativa da arte e da política, inaugurada pelos projectos de Beuys a que este movimento americano se referencia, como bem explicita um dos seus principais animadores, David Levy Strauss.

Bibliografia
Stachelhaus, Heiner, "Joseph Beuys", Ed. Parsifal, Barcelona, 1990
Beuys, Joseph, "Par la presente, je níappartient plus à leart", Ed. Learche, França, 1995
Beuys, Joseph, "Beuys in America", Ed. Stile, U.S.A., 1996
Filmes Vídeo
"Joseph Beuys Films", Centre G. Pompidou, Paris

Jacinto Rodrigues (Professor Catedrático da Universidade do Porto)
Artigo publicado previamento no Jornal "a Página", nº 101, Abril 2001, p. 12.

terça-feira, outubro 17, 2006

Decálogo da Ecologia

A ecologia é um nível superior de pensamento, onde tudo está relacionado com tudo, inclusive com as soluções. Como ciência do inter-relacionamento homem/natureza, ela não pode ser vista apenas como o estudo do meio físico, pois de suas pesquisas e análises depende a compreensão da harmonia entre o homem e o ambiente.

1. Ama a natureza, fonte de vida, honrando-a com dignidade, em todas as suas manifestações
2. Defende o solo onde vives, mas também aquele das demais criaturas
3. Proteje a vida dos animais, consentindo no seu abate somente para suprir as necessidades alimentares
4. Condena a produção que favorece unicamente o produtor, em detrimento da satisfação das necessidades do consumidor
5. Condena a agricultura irracional, predatória, contaminante, que tanto "sustenta" como elimina vidas
6. Não consumas alimentos suspeitos de incluirem componentes nocivos
7. Não compartilhes do modismo vulgar de que "desenvolvimento & progresso" do actual modelo socio-económico justificam tecnologias alienantes ou destrutivas
8. Denuncia todos os crimes contra a Ecologia
9. Analisa racionalmente o comportamento humano com relação ao avanço da tecnologia, bem como os referemtes aos actuais clichês políticos; indaga, pesquisa, reflete, contesta, procura esclarecer-te à luz da ciência e da ética sobre todos os actos da existência, sem escravizares-te a modismos, conceitos e convenções.
10. Liberta a tua mente e não aumentes as fileiras de acomodados mentais ou de servos da hipocrisia, pois outros podem tirar proveito do teu ideal.

Fonte: AME - Fundação Mundial de Ecologia http://www.ecologia.org.br
(Via blogue "Points of Light", a quem agradecemos)

segunda-feira, outubro 09, 2006

Urgente Edifícios Menos Poluentes


No passado dia 1 de Outubro (dia mundial da arquitectura e simultâneamente do habitat humano) a QUERCUS chamou "a atenção da sociedade civil para a necessidade de uma arquitectura mais sustentável, directamente responsável pela qualidade do habitat humano."
O artigo pode ser lido integralmente aqui (clicar)

terça-feira, outubro 03, 2006

Tempo de Teatro



Até ao próximo dia 8 ainda é possível ver a magnífica peça "Os Negros", de Jean Genet, encenada por Rogério de Carvalho, no Teatro Nacional de S. João, no Porto.

«Primeira incursão do TNSJ na curta, mas fulgurante, obra teatral de Jean Genet, a partir daquela que é muito provavelmente a peça que melhor materializa a ambição do autor de subtrair o teatro à realidade, projectando-o num espaço mágico e ritualizado onde o "real" e o "natural" são forçados a denunciar a sua impostura. Recusando qualquer tipo de aprisionamento sociopolítico da peça (não, não é uma "reflexão" sobre o racismo ou o colonialismo), o encenador Rogério de Carvalho parte para a edificação desta prodigiosa "arquitectura do vazio das palavras" à frente de um elenco constituído por actores negros com raízes na África lusófona, empenhados em emprestar à retórica de Genet o sabor dos múltiplos sotaques da língua portuguesa.» (in programa do TNSJ, Setembro - Dezembro 2006, Porto)

Um agradecimento especial ao RS, do blogue "
A Sombra", pela imagem que ilustra este texto e pela chamada de atenção ao facto que "assombrou" esta peça... A ler aqui.

terça-feira, setembro 26, 2006

"Uma Verdade Inconveniente"


Não será, seguramente, um candidato aos "Óscares" da Academia, mas será indubitávelmente um dos mais importantes filmes a ver dos últimos tempos. "Uma Verdade Inconveniente" é um documentário construído na primeira pessoa, narrado pelo senador Al Gore, num registo documental bastante acessível e sempre suportado por dados concretos e científicos.
Não é um filme "espectacular", nem irá ficar na história do cinema pelos seus créditos artísticos, mas ser-lhe-à reservado um lugar de destaque como um dos "projectos" globais mais importantes deste início de século, pela acuidade e "coragem" do seu autor... Obrigado Al Gore. Este é um filme que deveria ser "obrigatório" nas escolas... e não só.
Destaques também no "A Sombra" e "Quinta do Sargaçal"... (Xucrán)!
(Para aceder ao endereço oficial do filme basta "clicar" na imagem)

segunda-feira, setembro 18, 2006

O filme da semana...

Chama-se "A Caminho de Guantánamo" e ainda pode ser em algumas salas de cinema do "Grande Porto". Foi o filme que venceu o prémio de melhor realização na edição deste ano do Festival Internacional de Cinema de Berlim... O "poster" que se apresenta é a versão não censurada do cartaz de apresentação... (Gostávamos de saber o porquê da censura, afinal não se trata de nenhum "cartoon...)
«Parte ficção, parte documentário, "A Caminho de Guantanamo" é um olhar que nos leva ao interior da mais polémica prisão americana. O filme relata a história de três muçulmanos britânicos que estiveram detidos durante dois anos, em Guanánamo, Cuba, sem qualquer acusação. Conhecidos como "Os Três de Tipton", numa referência à sua cidade natal no Reino Unido, os três homens tinham deixado o Reino Unido para assistir a um casamento no Paquistão e acabaram capturados e detidos. Foram libertados ao fim de dois anos sem qualquer acusação.

Numa altura em que voltam a estar na mesa as suspeitas de violações dos direitos humanos nas prisões americanas e em que o Presidente George W. Bush admite estar a "estudar todas as possibilidades" para Guantanamo, antevendo a hipótese do seu encerramento, o filme de Michael Winterbottom ("9 Canções", "24 Hour Party People") lança novas achas para o debate.
"A Caminho de Guantanamo" ganhou o Urso de Prata para Melhor Realizador no Festival de Berlim, em 2006.»
In PUBLICO.PT
Para aceder ao endereço oficial do filme e ver mais pormenores basta "clicar" na imagem.

II ECOWOOD 2006


O CEMAS - Centro de Modelação e Análise de Sistemas Ambientais, da Faculdade de Ciência e Tecnologia da Universidade Fernando Pessoa - vai realizar a 2.ª edição da conferência "EcoWood", entre os próximo dias 20 e 22 de Setembro.
"Os principais objectivos da conferência são, por um lado, a divulgação dos últimos resultados do desenvolvimento de processos e/ou produtos derivados da floresta, ou de outras fontes de fibras naturais, mas com a especificidade de implicarem um menor impacte ambiental negativo do que os produtos/processos tradicionais, e, por outro lado, o de se constituir como um fórum onde investigadores e empresários poderão trocar experiências e discutir os sus interesses nas áreas da conferência." (...)
Para obter mais informações (clicar aqui)

quarta-feira, setembro 13, 2006

Notícias preocupantes...

Pentágono alvo de inquérito

por suspeitas de ter enganado investigadores e público em relação ao 11 de Setembro

A comissão que analisou a reacção norte-americana aos ataques do 11 de Setembro admitiu abrir um inquérito ao Pentágono, suspeito de ter enganado os investigadores e o público, segundo a edição de hoje do Washington Post, citada pela agência Lusa.

De acordo com o jornal, a comissão encontrou divergências entre as declarações dos responsáveis do comando do espaço aéreo norte- americano (NORAD) e a administração federal de aviação (FAA) acerca dos desvios dos aviões de Setembro de 2001.

A comissão, durante uma reunião secreta no final da sua investigação em 2004, considerou que aqueles responsáveis tinham sem dúvida infringido a lei ao fazer falsas declarações para tentar dissimular a sua reacção inadequada após os desvios, afirmaram ao diário fontes próximas do dossier.

Os investigadores decidiram então passar o dossier não ao Departamento de Justiça, mas aos inspectores-gerais dos Departamentos da Defesa e dos Transportes.

O relatório dos inspectores está concluído, explicou uma porta- voz da FAA ao jornal, sem revelar o seu conteúdo.

Durante os dois anos que se seguiram aos ataques, o Pentágono afirmou ter reagido rapidamente.

Mas a comissão, após ter escutado cassetes áudio, concluiu que a força aérea nunca chegou a ter os aviões desviados na sua linha de mira.

In Portugal Diário de 2 de Agosto de 2006

segunda-feira, setembro 11, 2006

Contra o terrorismo...


Há cinco anos caíam as torres gémeas do World Trade Center, fruto de um dos mais ignominiosos atentados terroristas da história. Há cinco anos todos éramos americanos... Porém, na altura, poucos foram os que tentaram perceber o que se tinha passado. Poucos foram os que se questionaram e que tentaram obter explicações para tudo o que aconteceu... Para a maioria bastou-lhes a "explicação oficial". Uns porque, em estado de choque, não queriam pensar. (As bombas são diferentes consoante vistas de cima, ou de baixo, como era agora, pela primeira vez, o caso...), outros porque não queriam ser apelidados de anti-patriotas, ou mesmo terroristas. E, para isso, bastava duvidar das palavras do poder e da "versão oficial". Funcionou a censura e a auto-censura (as imagens do Pentágono não mais foram vistas, p. e.). Após cinco anos, porém começam-se a ouvir muitas vozes, cada vez mais e mais fortes a exigir saber o que realmente sucedeu naquele dia, pois muitas perguntas permanecem sem resposta, até hoje...
Um dos mais "incómodos" documentos que a América produziu chama-se "Loose Change" e coloca muitas (demasiadas) questões destruindo por completo a "versão oficial" dos atentados. (Para visualizar o documentário basta clicar no título sublinhado).
Também em 11 de Setembro de 1973 a maioria preferiu aceitar a "versão oficial" dos acontecimentos passados no Chile, fechando os olhos ao "terrorismo de Estado" perpetrado contra um estado soberano e contra um presidente eleito por escrutínio democrático, cuso resultado se saldou pelo próprio assassínio do Presidente (Salvador Allende - a "versão oficial" diz que se "suicidou"...) e pelo assassínio e desaparecimento de mais de meio milhão de pessoas. A história encarregar-se-ia de trazer a verdade à superfície...
O terrorismo não tem côr. Não há terrorismo preto nem terrorismo branco... Por outro lado é impossível ser contra o terrorismo sem ser contra a guerra, pois todas as guerras são sempre géneros de terrorismo. Todas as formas de terrorismo são igualmente condenáveis, sendo que não podemos lançar pedras ao ar esperando que estas nunca nos caiam em cima das nossas próprias cabeças!...

quinta-feira, setembro 07, 2006

Congresso sobre Turismo Cultural

O Instituto Politécnico de Leiria promove, durante os dias 29 e 30 de Novembro próximos o congresso "Turismo Cultural. Territórios e Identidades". (Clicar na frase sublinhada para aceder a mais informações).

segunda-feira, julho 17, 2006

O paradigma em transição, o mercado e o ensino da arquitectura e do urbanismo

Por Jacinto Rodrigues

1. O estudo sobre as instituições pedagógicas exige uma análise aos mecanismos de funcionamento e gestão, aos currículos formativos e aos conteúdos programáticos. Exige ainda a compreensão dos perfis pedagógicos dos docentes e as relações existentes entre a formação curricular e os formandos.

As instituições pedagógicas têm assim especificidades próprias que lhes conferem um maior ou menor grau de qualificação científica e também uma maior ou menor democraticidade no funcionamento. Ainda, a estrutura curricular garante uma maior ou menor abertura crítica ao sistema de reprodução de poder.

Esta análise intrínseca dos vários sujeitos e desempenhos, no interior das instituições, é importante para a compreensão do modelo de ensino, permitindo caracterizar a rigidez ou a flexibilidade da organização face à mudança social.

Assim, a universidade, tal como qualquer instituição total, manifesta o seu carácter carceral, assistencial ou autonomizador através das suas lógicas disciplinares.

Não é objectivo deste artigo fazer "análise institucional". Pretende-se aqui, situar as instituições de ensino da arquitectura e do urbanismo, à luz dos paradigmas económico-sociais em que se inserem, revelando as pressões exercidas pelo mercado e pela dinâmica histórica produzida pelos conflitos sociais e pelas transformações técnicas.

2. Importa perceber que a noção de paradigma aqui utilizada, não expressa uma tipologia estática. O movimento histórico das relações sociais, das tecnologias e das ideias, manifesta-se através de antagonismos e contradições entre vários protagonistas e desempenhos sócio-profissionais que se expressam nas convulsões ou mudanças organizacionais. Daí que a noção de paradigma apareça como referente didáctico, pois na realidade existem transparadigmas que se metamorfoseiam ou entram em ruptura continuamente, manifestando diferentes aspectos do poder político, ora hegemónicos, ora subalternizados.

Acontece que, o que se nos afigura como a hegemonia dum poder, revela muitas vezes a fase final desse "modelo", prestes a sucumbir na voragem dos antagonismos que esse próprio poder gerou.

O capitalismo desta etapa da globalização, ou seja, da era da biotecnologia e da informática, acelerou a concentração monopolista e hegemoniza, graças ao capital financeiro, todos os processos de produção, consumo material. E tem expressão também no conhecimento, ou seja, nos quadros referenciais da produção teórica.

A globalização é pois a continuação dum processo da mundialização do capital, iniciado desde o séc. XV. Porém, as transformações técnicas e organizativas sofreram metamorfoses sucessivas.

Se o capitalismo do petróleo e da electricidade tinha o "fordismo" como expressão moderna do funcionamento das empresas e das instituições, privilegiando o carácter dos "estados-nação", o capitalismo da globalização tem o "toyotismo" como expressão das novas formas de organização empresarial. Nesta última fase, o "império" pretende sobrepôr-se ao "estado-nação". Uma cultura supra-modernista manifesta-se através dum desejo de integração mundializada dos estados, num consumismo de massas mais alargado e numa cultura dominante onde a indústria mediática valoriza o "entretimento", o pensamento e o comportamento homogeneizados, permitindo apenas singularidades "guetizadas" para aparentes consensos democráticos com maior eficácia do que consensos totalitários, impostos violentamente.

Esta nova fase foi acentuada por uma dupla estratégia que desenvolveu em simultâneo:

  • a livre concorrência do neo-liberalismo conducente à vitória dos mais poderosos (factor essencial da monopolização crescente);
  • uma regulação estratégica entre os interesses hegemónicos através de organizações mundiais com atribuições económicas no mercado (F.M.I., U.E., A.P.E.C., MERCOSUR). Essas instituições governamentais mundiais fixaram também quadros jurídicos e políticos para esta "nova ordem mundial" (O.N.U., O.C.D.E., O.M.C.). E a tradução militar dessa regulação unificou os países de economia dominante numa estratégia geo-político-militar através da N.A.T.O.

Assim, assistimos por um lado a uma sociedade fragmentada e a uma cultura de mosaico, de conflitualidade e decomposição crescente (droga, criminalidade, doença, exlusão). Por outro lado, outras expressões sociais intentam fabricar consensos de maiorias com intuitos de marginalização das minorias críticas a este modelo dominante.

Assim, acentuam-se os laços de cosmopolitismo entre o capital monopolista que se caracteriza pela sua implantação transterritorial e graças ao anonimato dos accionistas. Nesta óptica, o estado e os governos tornam-se empresas de gestão dos interesses monopolistas. E os políticos têm tanto mais eficácia quanto maior "arregimentação" popular conseguem para a representatividade desse poder.

Estas mudanças significativas na mundialização económica, afectam toda a sociedade.

Para a consolidação dessa estratégia são necessários dispositivos territoriais que consolidem e façam reproduzir essa mesma estratégia de poder.

- As metropólis constituem a expressão territorial deste novo ordenamento em que os "shopings", as "gares" e os aeroportos se disseminam numa descentração geo-política dos pólos decisionais, das zonas estratégico-militares e dos pólos tecno-científicos. Não existe uma verdadeira descentralização onde participem as populações, mas sim uma descentração para maior flexibilidade do poder sobre o território e as populações em geral.

Ao desenvolver-se essa ordem territorial tecnocrática, cresce, ao mesmo tempo, uma desordem na periferia. A "cancerização" urbana, aloja os excluídos, forja as "metástases" dos subúrbios degradados, dormitórios depósitos onde se refugiam emigrantes e outros excluídos.

Surgem modelos duma nova arquitectura que se apresenta como processo de reforço engenharial em que a tecno-ciência é empregue na "requalificação" de fachadas. Procuram situações de espectáculo para a promoção do poder político, ao mesmo tempo que se diversificam novos centros de consumo e se flexibilizam novas formas de domínio através de dispositivos topológicos que são novas formas de panópticos modernizados.

Esta arquitectura funciona "como rosto do poder" sem mudança estrutural.

O design da arquitectura e do urbanismo que melhor se adapta a este processo de homogeneização promove, a par de linguagens únicas e dominantes, diferenciações aparentes, graças a um certo uso do desenho assistido por computadores.

Assim, os novos modelos de arquitectura e urbanismo, do chamado supra-modernismo, caracterizam-se por um neo-funcionalismo "high-tec" que se permite revestir com "singularidades" formais, maquilhagens do artifício produzido por essa computarização do design, submetida aos designers do lucro.

3. Assim, um certo ensino da arquitectura e do urbanismo é chamado a consolidar esta estratégia dominante.

Acontece porém que, face a esta visível globalização do modelo capitalista, surgem contradições cada vez mais consequentes, na sua expressão de mudança e alternativa.

Não se torna evidente o apagamento dos nacionalismos face aos interesses internacionais do capitalismo. Surgiram mesmo expressões nacionalistas, cada vez mais agressivas, não se podendo afirmar a falência dos estados-nação.

Assim , ao estudarmos o paradigma da globalização, não podemos deixar de analisar as conflitualidades crescentes que assentam no antagonismo social.

A globalização acelerou o esgotamento dos recursos naturais e fez aumentar a poluição. As contradições entre o capital e o trabalho levaram à crescente exclusão de novos grupos sociais, aparecendo novas frentes de lutas. O fosso entre os países de economia dominante e os países de economia dominada foi-se alargando, produzindo uma miséria crescente, uma situação larvar de guerra e genocídio que caracteriza os fenómenos políticos mais evidentes nos países de economia dominada.

Clarificam-se estratégias, acentuam-se polaridades entre o modelo civilizacional tecno-científico e uma proposta alternativa de desenvolvimento ecologicamente sustentável. As preocupações ecológicas são cada vez mais evidentes e as alternativas concretas vão já surgindo como expressão do novo paradigma emergente.

O desenvolvimento ecologicamente sustentável torna-se assim mais claro aos olhos dos cidadãos que sofrem as consequências da globalização, geradora de poluição e de esgotamento dos bens naturais.

Também o movimento social, contra a globalização monopolista, começa agora a dar novos passos em torno de uma geo-política internacionalista e solidária. O movimento de Seatle até Porto Alegre aponta para uma nova esperança do movimento social em busca de soluções de um novo modelo civilizacional em que as energias renováveis, os processos de reciclagem e de regeneração da natureza, consigam impôr-se aos cataclismos gerados pelo paradigma da globalização. É a sociedade civil em busca de uma economia mais humanizada.

Essas rupturas ideológicas e esses novos desafios sociais, inserem-se em múltiplas brechas abertas na sociedade contemporânea.

Assim, para além das lutas e confrontos claramente manifestados contra o poder, surgem intervenções de mudança no próprio terreno instituído. Existem assim processos de ruptura em simultâneo com acomodações e adaptações.

O sistema da globalização não é incólume às novas reivindicações sociais e ecológicas. O próprio mercado aparece sensível aos novos consumos marcados por uma consciência social verde.

Com efeito, uma base social ecológica alargou-se, cada vez mais, em virtude dos graves efeitos devastadores sobre o planeta, numa exploração cega e destruidora. O alargamento da planetarização faz com que assistamos à pilotagem crescente de interesses financeiros sobre uma nova indústria verde que pretende acomodar-se às novas reivindicações continuando a auferir lucros. Isto porém, é já o sintoma de uma brecha cada vez mais profunda no modelo político hegemónico que subverte a sua própria lógica.

4. Conflito e acomodação caracterizam portanto, a situação actual deste paradigma em transição.

As preocupações de eco-desenvolvimento, as propostas de eco-cidades e o aparecimento do planeamento participado são novas frentes que têm reflexo nas propostas de ensino, no conteúdo dos projectos expressos e na realização de propostas arquitectónicas e urbanísticas. Assim, existem mesmo hoje, realizações de novos projectos de eco-desenvolvimento em curso, provenientes de "estrelas" significativas na arquitectura e no urbanismo que optaram por soluções ecológicas na realização das suas edificações. Os nomes de Foster, Herzog, Pianno, Perraudin e Lucien Croll, aparecem ligados à arquitectura solar e ao eco-urbanismo. As revistas, publicações e congressos de especialidade transcrevem e apoiam cada vez mais projectos ecológicos. Novos utentes reclamam novos lugares. As Câmaras exigem novos tipos de implantações. Estes sinais são significativos e constituem referências para a mudança no ensino da arquitectura e do urbanismo.

Deste modo assistimos a uma conflitualidade que atravessa toda a sociedade entre uma globalização de interesses meramente monopolistas e uma planetarização crescente que resulta de uma tomada de consciência ecológica e social.

O ensino reflecte este antagonismo. Se existem modelos de ensino que tendem a encarar a arquitectura como resposta tecnicista tendo em conta apenas os interesses lucrativos, existem cada vez mais propostas que tendem a expressar alternativas ao processos de planetarização em curso.

5. No terreno institucional aparecem pois estas duas tendências: escolas de ensino onde o perfil do arquitecto assenta essencialmente no pragmatismo, na eficácia, na competitividade tecnocrática e escolas de ensino onde se procura uma reflexão sobre o porquê das formas arquitecturais e urbanísticas e a busca de novas alternativas. Existe ainda, no seio duma mesma escola, esta dualidade de tendências.

O que caracteriza o ensino tecnocrático é o desprezo da reflexão teórica. A história da arquitectura aparece apenas como cardápio de modas. Substitui-se o processo educativo baseado na reflexão, pelo didactismo –expressão operativa – ou seja "treinamento" às respostas previstas pelo poder hegemónico. A tendência tecnocrática pretende apenas saber o "como" fazer.

A tendência crítica orienta-se mais para o "porquê". Procura uma reflexão epistemológica da história da arquitectura e do urbanismo, tendente à criação de respostas mais sensíveis aos interesses públicos. O centro das suas preocupações é o paradigma emergente dum desenvolvimento ecologicamente sustentado. Uma sociedade civil cada vez mais consciente, ecologicamente, á promotora desta nova "encomenda social".

6. A faculdade de arquitectura da universidade do porto, a uma escala reduzida e com o provincianismo que caracteriza o fenómeno português, na periferia destas convulsões mundiais, expressa, no entanto, os antagonismos e as contradições que acabamos de relatar. A orientação "pragmatista do conselho científico desta faculdade, presidida pelo arquitecto Nuno Portas, representa a tentativa de eliminação do ensino teórico reflexivo. Ostraciza-se o ensino teórico e promove-se uma vaga noção de "projecto" que significa uma resposta tecno-formal, alheia dos interesses públicos. Estimula-se o fachadismo e a tecno-ciência em detrimento da eco-técnica e da reflexão teórica. Isso caracteriza o ensino nestes últimos anos e a orientação do seu conselho científico, constituído na base dum golpe burocrático e estatutário.

Porém, é o movimento crescente das questões ecológicas, (reflexo dessa mesma preocupação na sociedade portuguesa e mundial), que vai inventando uma alternativa a esta escola moribunda.

Professor Doutor António Jacinto Rodrigues
Professor Catedrático da Faculdade de Arquitectura da Universidade do Porto
[Texto previamente publicado no Jornal "a Página" , ano 10, nº 100, Março 2001, p. 10]

quinta-feira, julho 06, 2006

Cipreste classificado em Boassas



Por intermédio da Associação Por Boassas [APOBO], foi recentemente classificado como de Interesse Público pela Direcção-Geral dos Recursos Florestais o "Cupressus sempervirens, L.", existente no jardim da Casa do Outeiro, em Boassas. A povoação está de parabéns, assim como o Vale do Bestança e o próprio concelho de Cinfães que vê, assim, ser classificada a sua primeira árvore. Mais informação pode ser obtida no blogue da APOBO - Boassas (clicar).

(Photo Manuel da Cerveira Pinto . copyright 2006 . all rihgts reserved)

quinta-feira, junho 01, 2006

Curso de construção em taipa...

Voltamos a recordar que se encontram abertas as inscrições para o CURSO DE CONSTRUÇÃO EM TAIPA. Irá decorrer de 3 a 16 de Julho 2006 em Odemira, no Alentejo. Curso de 14 dias com pernoitamento e comida vegetariana. Limite máximo de participantes - 12. Mais informações aqui.

quinta-feira, maio 18, 2006

Exibição do filme "A utopia do Padre Himalaya"

Conversas na Sede (da Associação Campo Aberto)
Com o Professor Doutor Jacinto Rodrigues














Esta sexta-feira, dia 19, pelas 21h30, na sede da Campo Aberto
(Rua de Santa Catarina, 730 - 2º), será exibido o filme "A utopia do Padre Himalaya", realizado por Jorge António e que será apresentado pelo Prof. Jacinto Rodrigues, autor do livro "A Conspiração Solar do Padre Himalaya", que inspirou o filme.

Trata-se de uma obra cinematográfica sobre a vida e obra de uma personalidade extraordinária, o padre Himalaia, falecido em 1933, sacerdote católico, grande viajante, espírito humanista e cientista - autor de uma «máquina solar» que pode ser considerada precursora da actual tecnologia solar energética e que foi apresentada na Exposição de St. Louis (EUA) em 1904, onde recebeu um grande prémio.


Vimos por este meio convidar todos os sócios e amigos da Campo Aberto para este evento, cujo interesse não é de mais salientar - quer pelo filme, quer pela intervenção esclarecedora de Jacinto Rodrigues.


Jacinto Rodrigues é Professor Catedrático da Faculdade de Arquitectura da Universidade do Porto, onde rege actualmente a cadeira de Ecologia Urbana, e investigador do Centro de Estudos Africanos da Faculdade de Letras da mesma Universidade. É autor de diversos livros sobre Urbanismo, Ecologia, História da Arte e Arquitectura.


Foto: Padre Himalaya numa fotografia datada de 1902. (Arquivo Professor Jacinto Rodrigues)
Informação retirada do blog da Associação Campo Aberto

segunda-feira, maio 15, 2006

Universidade Experimental do Meio Ambiente

Ideias para um Projecto
Sentamo-nos à volta da mesa; o Paulo Serralheiro, a Helena Ricca, o Luís Pinto, o Queirós e eu. Depois, numa sessão seguinte tivemos o concurso do Rangel. Lateralmente entrou na "roda" o Franklin que por sua vez anda envolvido num grupo, em Braga, com afinidades neste projecto, onde o desenvolvimento ecologicamente sustentado é a base essencial.

1. Filosofia para o local da U.E.M.A.

A morfologia das edificações será como uma espécie de envelope espacial adaptável às várias funções sociais que determinam a estratégia de universidade livre. Ora a função estratégica do conteúdo pedagógico da universidade livre, consiste essencialmente em propor uma tomada de consciência das questões do meio ambiente e sobretudo a necessidade dum processo de implantação de homens no território onde o desenvolvimento seja ecologicamente sustentável. Essa tomada de consciência faz-se através duma vivência concreta. Ora esta edificação proposta para a universidade livre do meio ambiente, pretende ser uma experiência exemplar em que morfologia, sistemas de funcionamento e escolha de materiais se tornem a expressão didáctica do processo ecológico.
A estrutura arquitectónica revela em termos eco-técnicos o funcionamento dum eco-sistema auto-regulável pela intervenção humana.
O edifício é assim um nicho, um abrigo, um biótopo que procura relacionar-se com a natureza envolvente, duma forma saudável: bioclima, energias renováveis, reciclagem de lixos, materiais naturais, são as opções centrais deste eco-design explicitado na organização territorial, na arquitectura e no mobiliário.

2. Programa logístico

1. Auditório e sala polivalente;
2. Laboratório oficinal e terreno para demonstração de protótipos ecológicos: biodigestor de gás metano, diferentes eólicas, fornos solares e colectores solares, etc.
3. Atelier de saúde: sauna, massagem, hidroterapia, dança, etc.
4. Centro informático de documentação e mediateca;
5. Sala de exposições;
6. Cozinha e cantina;
7. Hortas, estufas, jardim aromático e medicinal com as respectivas estruturas de apoio. Este território dará lugar a várias práticas de agricultura biológica, paisagismo, jardinagem, permacultura, biodinâmica, etc.
8. Lago eco-e.t.a.r.;
9. Lago-piscina;
10. Bosque e viveiro;
11. Centro lúdico com jardim de aventuras;
12. Apoios sanitários;
13. Arrumos;

3. O Projecto arquitectónico

Falamos ao arquitecto Agostinho Ricca. Em breve recebemos os primeiros esquissos dum projecto.

4. Os sistemas eco-tecnológicos

Estamos a estudar materiais de construção, estufas, processos de aquecimento, protótipos de energia renovável, etc....

5. O funcionamento dum projecto eco-educativo
6. Eco-Design

Mobiliário de interior e mobiliário para exterior.

7. Organização Territorial

Eventual refúgio, casas unifamiliares e estruturas de apoio comunitário, hortas, jardins, bosques e lago.

Ponto da situação

O grupo de trabalho necessita de se alargar. Exigências transdisciplinares fazem com que este projecto procure colaboradores, contactos com outras instituições congéneres e sobretudo aguarda-se por uma câmara ou junta de freguesia susceptível de apoiar logisticamente este projecto numa "régie", em que vários intervenientes e sujeitos institucionais possam encontrar uma estratégia comum de formação civil à consciência ecológica e manutenção de espaços públicos exemplares.
Se estiveres interessado, contacta-nos através do e.mail: pagina@mail.telepac.pt

Jacinto Rodrigues
Professor Catedrático da Faculdade de Arquitectura da Universidade do Porto

(Texto publicado previamente no Jornal "A Página", ano 9, nº 97, Dezembro 2000, p. 21.)

segunda-feira, maio 08, 2006

Terra Sã . Porto 2006


É já nos próximos dias 2, 3 e 4 de Junho a edição de 2006 da Terra Sã, Feira Biológica da Alimentação, Agricultura e Ambiente. Recordamos que no ano passado Boassas esteve representada neste evento, como "Aldeia de Portugal", por intermédio da Associação de Turismo de Aldeia. Esperemos que tal volte a suceder nesta edição. Para mais informação consultar o espaço da "AGROBIO".

sexta-feira, abril 28, 2006

S.M.S. de Saúde Pública

O Sofista bocejou com a ética
Modernizou-se e criou a quadrícula

adormeceu à sombra da estética
vai acordar um dia, na posição mais ridícula.

O ocidente globalizador e globalizante
estendeu os tentáculos sugadores à sua aldeia
consumindo 98 octanas com o fogo de Dante
dissecando o sangue de Gaia, tirando-lheo ar na apneia.

O Ser nascia da terra em Outrora
crescia na segurança da pedra intemporal
brincava com paus ao Sol da Aurora
abrigava-se em cerâmica, era simples e funcional.

Ora por agora
nasce na laje de betão
pintada de verde e castanho
e antes de ser anho
cresce na ilusão
da vinda de algo que demora.

David Oliveira, 23 de Fevereiro de 2006

(Comentário crítico ao texto do Professor Doutor Jacinto Rodrigues intitulado "Arquitectura e construção - Uma questão urgente", no âmbito da disciplina de Seminário da Faculdade de Arquitectura da Universidade Fernando Pessoa)

sexta-feira, abril 07, 2006

Curso de construção em terra

O Ecoaldeias - Portugal promove um curso de construção em taipa. É em Odemira, no Alentejo, de 3 a 16 de Julho. Tem a duração de 14 dias, com pernoitamento e comida vegetariana.

segunda-feira, abril 03, 2006

XVI Jornadas de Ambiente da Quercus...



XVI Jornadas do Ambiente - Quercus - 07 e 08 de Abril de 2006

“Construção Sustentável”

INTRODUÇÃO: A Quercus vai realizar as suas XVI Jornadas do Ambiente, nos dias 7 e 8 de Abril próximo, em Fátima. O tema escolhido é a “Construção Sustentável”. A alteração das características do clima, de uma forma acelerada, motivada pela alteração do equilíbrio da atmosfera provocada pela emissão de poluentes representará um dos maiores desafios para a Humanidade, já que se prevê que a temperatura global do planeta poderá aumentar entre 1 e 3 graus Celsius durante o século XXI. O consumo energético dos edifícios é responsável por uma parte considerável das emissões de gases responsáveis pelo efeito de estufa. Como a eficiência energética dos edifícios está ligada ao seu planeamento e construção, a adopção e boa execução das melhores soluções construtivas, bem como a utilização dos materiais mais indicados, serão contributos essenciais para a minimização ou anulação dos gastos energéticos com sistemas de climatização. A Quercus convidou especialistas com o intuito de se abordar dos fundamentos da construção sustentável, motivando novas práticas mais responsáveis e, ao mesmo tempo, proporcionar o intercâmbio de ideias e de experiências, citando exemplos e estudos de casos, dando assim a conhecer os resultados em várias áreas de intervenção. As inscrições são gratuitas e estão abertas a todos. Contamos com a sua participação!

No dia 7 irá ser apresentado o documentário "A conspiração solar do Padre Himalaya", seguido de debate com a presença do Professor Doutor Jacinto Rodrigues...

Para ver o programa e mais informações clicar aqui...

terça-feira, março 28, 2006

Sociedade e Território. Movimento de eco-aldeias

1. A fundação Rede Global de eco-aldeias, com sede internacional na Dinamarca, coordena autogestionariamente múltiplas redes continentais.É uma associação sem fins lucrativos que procura articular experiências de grupos que desejam construir o habitat de um modo ecologicamente sustentável. Informação, troca de experiências, exposições e actividades de formação são as múltiplas vertentes de rede internacional que se expressa em numerosos países e cuja sede europeia está agora implantada na Itália: GEN Europe, Via Torri superiori 5, 18039, Ventimiglia, Italy, e.mail: info@gen-europe.org.
Todas estas experiências ligadas ao movimento das eco-aldeias têm traços comuns estratégicos que se podem resumir essencialmente na preocupação ambientalista e no desenvolvimento ecologicamente sustentado. Todavia, as singularidades dessas experiências estão patentes na multiplicidade de projectos, nos modelos de gestão, na morfologia das edificações e nas soluções eco-técnicas utilizadas.
Também a localização dessas experiências variam profundamente pois encontram-se desde comunidades rurais isoladas até bairros citadinos periféricos.
O que caracteriza o projecto das eco-aldeias é a especificidade de cada experiência. A génese de uma eco-aldeia pode surgir por um acordo dos habitantes de um bairro pré-existente ou por um conjunto de amigos que resolvem comprar um terreno e aí construirem as suas casas. A importância da existência da coordenação das eco-aldeias é que as redes põem à disposição informação e experiência de múltiplas escolhas possíveis de sistemas energéticos, materiais de construção, eventual apoio jurídico e informativo no crédito bancário ou dos vários tipos possíveis de modos de gestão.
Vamos descrever a génese de uma pequena eco-aldeia em Moisdon-la-Rivière, em França e que fomos visitar. Servirá apenas como um exemplo. Esta referência não deve ser considerada típica pois são múltiplas as formas que originaram outras eco-aldeias. Queremos com esta reportagem restituir uma viagem que fizemos e que nos proporcionou conhecer um dos pioneiros deste movimento em França, Patrick Baronnet.

2.
Chegamos ao princípio da tarde. Foi difícil dar com a aldeia de Moisdon la Rivière. Só quando tomamos a estrada de Louisfert é que descobrimos o caminho do pequeno conjunto de casas rurais recuperadas, formando como que um vilarejo perdido entre o bosque verdejante da Bretanha e o vale de pastagens ao longo da ribeira, serpenteando ao fundo das mansas colinas. Logo à chegada descortinamos duas eólicas. Um velho moínho de vento em ferro, a lembrar os filmes do Far West e uma moderna e elegante eólica

aerodinâmica. A rústica casa em pedra logo ali à beira da estrada, pertencia à família
Baronnet. Eu levava debaixo do braço o livro de Patrick Baronnet "De la maison autonome à l'autonomie de penser", Ed. Le Soufle d'Or et L'Orée du Bois, 1997.
O Patrick fez-nos entrar para uma ampla sala e não tardou a aparecer a Brigitte Baronnet, com uma chaleira de chá de alecrim e uns biscoitos de aveia. A Rosa montou o tripé e o vídeo e começamos a entrevista.

Quando, quem e como começou a eco-aldeia?
Pouco depois de Maio de 68, o Patrick e a Brigitte sentiram que desejavam inventar um outro modo de viver. Vieram como professores para aquela região e iniciaram uma experiência de vida que a pouco e pouco os levou a um emprego a meio tempo para dar vasão à multiplicidade de tarefas: restaurar a velha casa, fornecer-lhe conforto e o equipamento para a autonomia. A montagem da velha eólica, o equipamento solar para a água quente, a canalização da água, a sanita reciclável para utilização do "composto" agrícola, a organização do lago com o ecosistema de algas, peixes e patos, a estufa, a horta e o pomar.
E o Patrick Baronnet arregaçava as mangas e mostrava orgulhosamente as mão grandes com que tinha feito os muros e até mesmo o colector solar. Brigitte mostrou-nos o forno-lareira onde preparava as compotas, os biscoitos e as essências que conseguia depois vender no mercado. Depois, mostrou-nos também a harpa com que dava lições particulares de música celta às crianças da vizinhança. Entretanto nasceram quatro filhos. A casa foi-se apetrechando. Uma máquina de lavar que funciona ligada à água aquecida pelo colector solar e que trabalha com a energia eléctrica produzida pela nova eólica aerodinâmica. Um painel de foto-pilhas auto-orientável veio reforçar a produção eléctrica nos dias de menos vento. E a estufa envidraçada em torno da casa veio permitir uma melhor bio-climatização.
O forno-lareira veio também ajudar no aquecimento da serpentina feita pela tubagem de água em conexão com o colector solar fixo ao telhado do casarão rural.
Ao mesmo tempo vieram as cores risonhas dos quartos, as tapeçarias, as flores, os cristais e as conchas que enfeitavam as rústicas estantes e móveis da casa. "Fizemos tudo isto aos poucos. Empréstimos, o menos possível para não perdermos a vida a ganhar para pagar a triplicar..."
Fomos até à horta. As eólicas continuavam a girar, por detrás do pomar. Ao mesmo tempo que víamos as colmeias, o lago com os peixes e os patos, Patrick explicava: "Quisemos construir esta micro-economia, esta procura de desenvolvimento auto-sustentável não para cairmos numa autarcia egoísta. Quisemos sim consolidar uma autonomia económica que resultasse da nossa própria autonomia de pensar para pudermos ser solidários livremente".
Esta aposta na solidariedade foi surgindo pouco a pouco. Menos na base de discursos teóricos, mais na exemplaridade das experiências práticas. Mais na experiência dum auto-desenvolvimento em que os erros ensinam, do que na arrogância dos especialistas que apropria um saber apenas para si. Dos pequenos encontros surgiram pouco a pouco encontros mais amplos. Pierre Rabhi, um especialista internacional do desenvolvimento ecologicamente sustentado, prontificou-se a vir falar numa festa onde não faltou música celta e montagem arquitectónica de "domes" e "zomes" como futuras formas geodésicas de construções. E assim, outras pessoas da vizinhança foram-se ligando a esta rede de aspirações e interesses. Outros ainda vieram de mais longe em busca de terrenos e casarios velhos para aí instalarem o embrião desta eco-aldeia em Moisdon la Rivière.

3.
No Porto, um grupo de amigos juntou-se em busca de um terreno não muito longe da cidade. Um projecto de eco-aldeia anda no ar!... Será que isso interessa a mais gente?

Se estiveres interessado contacta para a redacção do jornal ou através do e.mail: pagina@mail.telepac.pt

António Jacinto Rodrigues (Professor Catedrático da Faculdade de Arquitectura da Universidade do Porto)
In Jornal "a Página" , ano 9, nº 94, Setembro 2000, p. 10.

segunda-feira, março 13, 2006

Nuclear?... Não, obrigado!!!


No dia 15 de Março completam-se 30 anos da marcha do povo da aldeia de Ferrel sobre o local onde decorriam trabalhos preparatórios para uma então projectada central nuclear, numa impressionante manifestação de recusa, pacífica e determinada. (Ler mais na EcoAgenda da Quercus). Agora que ressuscita essa perigosa (e inútil) ideia de construir centrais nucleares em Portugal, está agendada para Ferrel, domingo 19 de Março, nova manifestação para comemorar essa primeira grande recusa e relançar o debate sobre o problema energético em bases realmente sustentáveis, renováveis e alternativas. Inscrições e detalhes da deslocação informe-se na associação Campo Aberto. (Obrigado ao Bioterra)

quarta-feira, março 08, 2006

II Encontro Internacional de Ceramistas em Boassas

A Associação Por Boassas criou um blogue, designado "Encontros Internacionais de Ceramistas", onde se pode ler toda a informação sobre estes encontros (ceramistas participantes; programa; actividades paralelas; entidades patrocinadoras; etc.). O destaque vai para a próxima edição que irá decorrer durante o período de 8 a 22 de Abril próximo.

quinta-feira, fevereiro 23, 2006

Nuclear em Portugal?... Não, obrigado!



A "Sombra" é contra a energia nuclear. Pois, nós também!... Já o havíamos dito. Não deixa de ser curioso que enquanto países como a Alemanha encerram uma central nuclear por ano, por cá, certos "senhores" (sim, é eufemismo) proclamem hossanas e aleluias sobre o grande desenvolvimento do país. Está visto, é esta a solução para os males portugueses. Assim que se faça a primeira central nuclear (e se consiga exportar o lixo radioactivo para Angola ou o Biafra, para daqui a uns 20.000 anos dasactivar...) iremos ser então uma nação desenvolvida. Ultrapassando a própria Alemanha... Note-se. Vale a pena ler o(s) artigo(s) d'A SOMBRA - "Atomkraft? Nein danke!" e "Básico".

sexta-feira, fevereiro 17, 2006

«Energia eólica, uma fonte de energia limpa que se está a tornar cada vez mais suja»

«A energia eólica constitui uma fonte energética alternativa desde sempre defendida pelos ambientalistas e por todos aqueles que se preocupam com as questões ecológicas e o futuro do nosso Planeta. Há uns anos atrás, os seus defensores não passavam de “líricos ecologistas” aos olhos dos nossos governantes. (...)»
Assim começa este interessante artigo publicado no "COREMA", Associação de Defesa do Património. [Obrigado ao "Ondas", mais uma vez...]

sexta-feira, fevereiro 10, 2006

Planetarização versus globalização

A etapa actual do capitalismo tem vindo a impor adaptações ao sistema económico-social. Nos anos 70/80 novos mecanismos de regulação como o GATT, o FMI e o Banco Mundial, manifestavam já uma tendência para a reorganização geral da geopolítica das grandes empresas e dos partidos políticos no poder.
Esta tendência tornou-se mais marcante e visível na última década. Hoje, são já evidentes os resultados de uma sociedade informacional com sucessivas deslocações do capital financeiro, gerando uma maior internacionalização do processo produtivo.
As consequências dessa orientação do capital financeiro, aparecem claramente na gestão através do "toyotismo" das empresas, que veio substituir a antiga gestão "fordista".
Actualmente, a flexibilidade e a multifuncionalidade são apanágio das novas "empresas rede" em que os accionistas anónimos emprestam ao capital financeiro uma estratégia mundialista que desfaz as veleidades autonómicas das burguesias dos estados-nação.
Nesta mundialização económico-social há uma necessária reorganização territorial que se expressa nas propostas de metropolização urbanística e nas morfologias supra-modernistas da arquitectura dos nossos dias.
A globalização, ou seja a nova etapa da mundialização capitalista dirigida pela nova coordenação internacionalista dos grandes monopólios, exigiu uma igualização massificadora de modos de vida, de "cultura" global e consumismos igualizadores. Nas grandes superfícies comerciais e nas grandes produções mediáticas de "enterteinment" passam modelos homogeneizadores de modos de vida e pensamento único.
Contudo, à homogeneização mundialista das grandes empresas cada vez mais concentradas na mão de minorias proprietárias, contrapõe-se a fragmentação do mundo cada vez mais desigual.
Enquanto se concentram as riquezas em fracções cada vez mais restritas da população, aumentam os marginalizados nas sociedades economicamente dominantes. E, enquanto zonas geopolíticas esbanjam e ostentam mais riqueza, aumenta o fosso da pobreza e destruição noutras áreas do globo.
Os antagonismos essenciais da natureza injusta do capitalismo mantêm-se. Agravam-se até, muito embora os mecanismos de regulação aparentem "resolver" os sintomas da crise larvar e estrutural da sociedade baseada na exploração e lucro.
A globalização não corresponde pois a uma solução estrutural da sociedade.
Apresenta-se como uma reformulação na gestão desses antagonismos estruturais. E, se em certos locais esses sintomas de crise parecem estabilizar-se é porque noutros domínios a brecha está a agravar-se.
Ora, uma das rupturas que mais se manifesta é gerada pela contradição entre este modelo produtivo do capitalismo (civilização baseada na exploração de energias fósseis e numa tecno-ciência poluitiva e destruidora de bens naturais) e a biosfera cujos recursos são limitados e cuja capacidade de reciclagem não se coaduna com a velocidade e a forma destruidora desse modelo urbano-tecnológico.
Chamaremos "planetarização" à consciência ecológica cada vez mais alargada das populações face ao ritmo destruidor dos ecosistemas, produzido pelo modelo civilizacional actual.
Esta planetarização constitui uma força cada vez mais presente nas aspirações das populações e será um factor de mobilização crescente contra o processo da globalização, transportando as aspirações mais significativas de mudança civilizacional.
Interessa, desde já, mostrar alternativas eco-técnicas e eco-tópicas que, articuladas e inseridas nas lutas cívicas, revelam a vontade de realizar novas alternativas no território.
É preciso, cada vez mais, que as lutas cívicas se traduzam em dispositivos topológicos alternativos às morfologias carcerais e alienantes do território actual.
É preciso que as escolas de arquitectura e urbanismo ultrapassem o ensino de propostas de carácter formalista. São necessários projectos que não sejam apenas a expressão duma oratória morfológica ao discurso do poder.
É necessário que os técnicos e cientistas estabeleçam rupturas na tecno-ciência revelando alternativas eco-técnicas: protótipos de produção de energias alternativas, motores de energias renováveis, biotecnologias de reciclagem de lixos, etc.
É cada vez mais necessário que experiências exemplares irrompam, não como "guetos" utópicos mas como experiências dinâmicas que ganhem, cada vez mais, largos sectores da população.
As eco-polis, as eco-aldeias, as cidades educadoras, são propostas já existentes que contêm ideias, realizações e estímulos para um processo-estratégia, que dê expressão a novas aspirações e que acabe com a resignação reinante da submissão à globalização neo-liberal que anda por aí à solta.

Jacinto Rodrigues - Professor Catedrático da Faculdade de Arquitectura da Universidade do Porto
Texto previamente publicado no Jornal "a Página" nº 94 de Setembro 2000

Bibliografia

«Tornar Possível o Impossível», Marta Harnecker, Ed. Campos das Letras, 2000
«Metapolis ou l'Avenir des Villes», François Ascher, Ed. Odile Jacob, Paris, 1995
«Naturaleza y Ciudad », Michael Hough, Ed. G.G., 1998

quinta-feira, fevereiro 09, 2006

Em tempos conturbados...


Em tempos conturbados ainda há uma réstia de esperança... sobretudo quando nos deparamos com espaços como este "Local & Blogal". Um oásis para quem, neste actual deserto de ideias (e de valores) se sente "um cidadão do mundo"... A herança do al-Ândalus, de um tempo em que três diferentes culturas e religiões coexistiram e construiram uma civilização notável, felizmente, ainda se faz sentir após mais de cinco séculos... Resta-nos agradecer ao António Baeta Oliveira... (Xucrán!)

quinta-feira, janeiro 26, 2006

"Se queres a paz, cultiva a paz..."

Mahatma Gandhi

«No Dia 30 de Janeiro assinala-se, um pouco por todo o mundo, o Dia Mundial de Mahatma Gandhi em homenagem a esse grande mentor da Paz e Não-Violência, cujo assassinato ocorreu justamente nesse mesmo dia do ano de 1948.»
A ler no blog da associação "Campo Aberto".

quarta-feira, janeiro 18, 2006

Concurso Solar Padre Himalaya

Concurso Solar Padre Himalaya. Inscrições até 23 Janeiro para a 3ª edição deste concurso promovido pela Sociedade Portuguesa de Energia Solar (SPES) e a Ciência Viva. O objectivo é promover a divulgação das energias renováveis junto das crianças e jovens, através de actividades de projecto que façam uso de princípios científicos. O concurso, a decorrer até Junho de 2006, consiste na construção de protótipos que funcionam em condições reais de radiação solar e está organizado em seis escalões dirigidos a diferentes níveis de ensino. (Obrigado ao "ONDAS"). Para se saber mais sobre quem foi o "Padre Himalaya" pode-se ler na entrevista ao Professor Jacinto Rodrigues aqui publicada.

segunda-feira, janeiro 16, 2006

Hassan Fathy (n. Egipto, 1899; m. 1989)

Sim, gostamos muito da arquitectura (de terra) deste arquitecto egípcio que viveu a maior parte da sua vida no Cairo, onde trabalhava e onde foi professor na Escola de Belas Artes e também director da Escola de Arquitectura da Universidade do Cairo. Escreveu um livro de referência (penso que não editado em Portugal), intitulado "Architecture for the poor".


A imagem é uma foto da "Casa Sami". Para descobrir a arquitectura e personalidade deste autor aconselhamos a visita a - http://archnet.org/library/parties/one-party.tcl?party_id=1.