1. A fundação Rede Global de eco-aldeias, com sede internacional na Dinamarca, coordena autogestionariamente múltiplas redes continentais.É uma associação sem fins lucrativos que procura articular experiências de grupos que desejam construir o habitat de um modo ecologicamente sustentável. Informação, troca de experiências, exposições e actividades de formação são as múltiplas vertentes de rede internacional que se expressa em numerosos países e cuja sede europeia está agora implantada na Itália: GEN Europe, Via Torri superiori 5, 18039, Ventimiglia, Italy, e.mail: info@gen-europe.org.
Todas estas experiências ligadas ao movimento das eco-aldeias têm traços comuns estratégicos que se podem resumir essencialmente na preocupação ambientalista e no desenvolvimento ecologicamente sustentado. Todavia, as singularidades dessas experiências estão patentes na multiplicidade de projectos, nos modelos de gestão, na morfologia das edificações e nas soluções eco-técnicas utilizadas.
Também a localização dessas experiências variam profundamente pois encontram-se desde comunidades rurais isoladas até bairros citadinos periféricos.
O que caracteriza o projecto das eco-aldeias é a especificidade de cada experiência. A génese de uma eco-aldeia pode surgir por um acordo dos habitantes de um bairro pré-existente ou por um conjunto de amigos que resolvem comprar um terreno e aí construirem as suas casas. A importância da existência da coordenação das eco-aldeias é que as redes põem à disposição informação e experiência de múltiplas escolhas possíveis de sistemas energéticos, materiais de construção, eventual apoio jurídico e informativo no crédito bancário ou dos vários tipos possíveis de modos de gestão.
Vamos descrever a génese de uma pequena eco-aldeia em Moisdon-la-Rivière, em França e que fomos visitar. Servirá apenas como um exemplo. Esta referência não deve ser considerada típica pois são múltiplas as formas que originaram outras eco-aldeias. Queremos com esta reportagem restituir uma viagem que fizemos e que nos proporcionou conhecer um dos pioneiros deste movimento em França, Patrick Baronnet.
2. Chegamos ao princípio da tarde. Foi difícil dar com a aldeia de Moisdon la Rivière. Só quando tomamos a estrada de Louisfert é que descobrimos o caminho do pequeno conjunto de casas rurais recuperadas, formando como que um vilarejo perdido entre o bosque verdejante da Bretanha e o vale de pastagens ao longo da ribeira, serpenteando ao fundo das mansas colinas. Logo à chegada descortinamos duas eólicas. Um velho moínho de vento em ferro, a lembrar os filmes do Far West e uma moderna e elegante eólica
aerodinâmica. A rústica casa em pedra logo ali à beira da estrada, pertencia à família
Baronnet. Eu levava debaixo do braço o livro de Patrick Baronnet "De la maison autonome à l'autonomie de penser", Ed. Le Soufle d'Or et L'Orée du Bois, 1997.
O Patrick fez-nos entrar para uma ampla sala e não tardou a aparecer a Brigitte Baronnet, com uma chaleira de chá de alecrim e uns biscoitos de aveia. A Rosa montou o tripé e o vídeo e começamos a entrevista.
Quando, quem e como começou a eco-aldeia?
Pouco depois de Maio de 68, o Patrick e a Brigitte sentiram que desejavam inventar um outro modo de viver. Vieram como professores para aquela região e iniciaram uma experiência de vida que a pouco e pouco os levou a um emprego a meio tempo para dar vasão à multiplicidade de tarefas: restaurar a velha casa, fornecer-lhe conforto e o equipamento para a autonomia. A montagem da velha eólica, o equipamento solar para a água quente, a canalização da água, a sanita reciclável para utilização do "composto" agrícola, a organização do lago com o ecosistema de algas, peixes e patos, a estufa, a horta e o pomar.
E o Patrick Baronnet arregaçava as mangas e mostrava orgulhosamente as mão grandes com que tinha feito os muros e até mesmo o colector solar. Brigitte mostrou-nos o forno-lareira onde preparava as compotas, os biscoitos e as essências que conseguia depois vender no mercado. Depois, mostrou-nos também a harpa com que dava lições particulares de música celta às crianças da vizinhança. Entretanto nasceram quatro filhos. A casa foi-se apetrechando. Uma máquina de lavar que funciona ligada à água aquecida pelo colector solar e que trabalha com a energia eléctrica produzida pela nova eólica aerodinâmica. Um painel de foto-pilhas auto-orientável veio reforçar a produção eléctrica nos dias de menos vento. E a estufa envidraçada em torno da casa veio permitir uma melhor bio-climatização.
O forno-lareira veio também ajudar no aquecimento da serpentina feita pela tubagem de água em conexão com o colector solar fixo ao telhado do casarão rural.
Ao mesmo tempo vieram as cores risonhas dos quartos, as tapeçarias, as flores, os cristais e as conchas que enfeitavam as rústicas estantes e móveis da casa. "Fizemos tudo isto aos poucos. Empréstimos, o menos possível para não perdermos a vida a ganhar para pagar a triplicar..."
Fomos até à horta. As eólicas continuavam a girar, por detrás do pomar. Ao mesmo tempo que víamos as colmeias, o lago com os peixes e os patos, Patrick explicava: "Quisemos construir esta micro-economia, esta procura de desenvolvimento auto-sustentável não para cairmos numa autarcia egoísta. Quisemos sim consolidar uma autonomia económica que resultasse da nossa própria autonomia de pensar para pudermos ser solidários livremente".
Esta aposta na solidariedade foi surgindo pouco a pouco. Menos na base de discursos teóricos, mais na exemplaridade das experiências práticas. Mais na experiência dum auto-desenvolvimento em que os erros ensinam, do que na arrogância dos especialistas que apropria um saber apenas para si. Dos pequenos encontros surgiram pouco a pouco encontros mais amplos. Pierre Rabhi, um especialista internacional do desenvolvimento ecologicamente sustentado, prontificou-se a vir falar numa festa onde não faltou música celta e montagem arquitectónica de "domes" e "zomes" como futuras formas geodésicas de construções. E assim, outras pessoas da vizinhança foram-se ligando a esta rede de aspirações e interesses. Outros ainda vieram de mais longe em busca de terrenos e casarios velhos para aí instalarem o embrião desta eco-aldeia em Moisdon la Rivière.
3. No Porto, um grupo de amigos juntou-se em busca de um terreno não muito longe da cidade. Um projecto de eco-aldeia anda no ar!... Será que isso interessa a mais gente?
Se estiveres interessado contacta para a redacção do jornal ou através do e.mail: pagina@mail.telepac.pt
António Jacinto Rodrigues (Professor Catedrático da Faculdade de Arquitectura da Universidade do Porto)
In Jornal "a Página" , ano 9, nº 94, Setembro 2000, p. 10.
Todas estas experiências ligadas ao movimento das eco-aldeias têm traços comuns estratégicos que se podem resumir essencialmente na preocupação ambientalista e no desenvolvimento ecologicamente sustentado. Todavia, as singularidades dessas experiências estão patentes na multiplicidade de projectos, nos modelos de gestão, na morfologia das edificações e nas soluções eco-técnicas utilizadas.
Também a localização dessas experiências variam profundamente pois encontram-se desde comunidades rurais isoladas até bairros citadinos periféricos.
O que caracteriza o projecto das eco-aldeias é a especificidade de cada experiência. A génese de uma eco-aldeia pode surgir por um acordo dos habitantes de um bairro pré-existente ou por um conjunto de amigos que resolvem comprar um terreno e aí construirem as suas casas. A importância da existência da coordenação das eco-aldeias é que as redes põem à disposição informação e experiência de múltiplas escolhas possíveis de sistemas energéticos, materiais de construção, eventual apoio jurídico e informativo no crédito bancário ou dos vários tipos possíveis de modos de gestão.
Vamos descrever a génese de uma pequena eco-aldeia em Moisdon-la-Rivière, em França e que fomos visitar. Servirá apenas como um exemplo. Esta referência não deve ser considerada típica pois são múltiplas as formas que originaram outras eco-aldeias. Queremos com esta reportagem restituir uma viagem que fizemos e que nos proporcionou conhecer um dos pioneiros deste movimento em França, Patrick Baronnet.
2. Chegamos ao princípio da tarde. Foi difícil dar com a aldeia de Moisdon la Rivière. Só quando tomamos a estrada de Louisfert é que descobrimos o caminho do pequeno conjunto de casas rurais recuperadas, formando como que um vilarejo perdido entre o bosque verdejante da Bretanha e o vale de pastagens ao longo da ribeira, serpenteando ao fundo das mansas colinas. Logo à chegada descortinamos duas eólicas. Um velho moínho de vento em ferro, a lembrar os filmes do Far West e uma moderna e elegante eólica
aerodinâmica. A rústica casa em pedra logo ali à beira da estrada, pertencia à família
Baronnet. Eu levava debaixo do braço o livro de Patrick Baronnet "De la maison autonome à l'autonomie de penser", Ed. Le Soufle d'Or et L'Orée du Bois, 1997.
O Patrick fez-nos entrar para uma ampla sala e não tardou a aparecer a Brigitte Baronnet, com uma chaleira de chá de alecrim e uns biscoitos de aveia. A Rosa montou o tripé e o vídeo e começamos a entrevista.
Quando, quem e como começou a eco-aldeia?
Pouco depois de Maio de 68, o Patrick e a Brigitte sentiram que desejavam inventar um outro modo de viver. Vieram como professores para aquela região e iniciaram uma experiência de vida que a pouco e pouco os levou a um emprego a meio tempo para dar vasão à multiplicidade de tarefas: restaurar a velha casa, fornecer-lhe conforto e o equipamento para a autonomia. A montagem da velha eólica, o equipamento solar para a água quente, a canalização da água, a sanita reciclável para utilização do "composto" agrícola, a organização do lago com o ecosistema de algas, peixes e patos, a estufa, a horta e o pomar.
E o Patrick Baronnet arregaçava as mangas e mostrava orgulhosamente as mão grandes com que tinha feito os muros e até mesmo o colector solar. Brigitte mostrou-nos o forno-lareira onde preparava as compotas, os biscoitos e as essências que conseguia depois vender no mercado. Depois, mostrou-nos também a harpa com que dava lições particulares de música celta às crianças da vizinhança. Entretanto nasceram quatro filhos. A casa foi-se apetrechando. Uma máquina de lavar que funciona ligada à água aquecida pelo colector solar e que trabalha com a energia eléctrica produzida pela nova eólica aerodinâmica. Um painel de foto-pilhas auto-orientável veio reforçar a produção eléctrica nos dias de menos vento. E a estufa envidraçada em torno da casa veio permitir uma melhor bio-climatização.
O forno-lareira veio também ajudar no aquecimento da serpentina feita pela tubagem de água em conexão com o colector solar fixo ao telhado do casarão rural.
Ao mesmo tempo vieram as cores risonhas dos quartos, as tapeçarias, as flores, os cristais e as conchas que enfeitavam as rústicas estantes e móveis da casa. "Fizemos tudo isto aos poucos. Empréstimos, o menos possível para não perdermos a vida a ganhar para pagar a triplicar..."
Fomos até à horta. As eólicas continuavam a girar, por detrás do pomar. Ao mesmo tempo que víamos as colmeias, o lago com os peixes e os patos, Patrick explicava: "Quisemos construir esta micro-economia, esta procura de desenvolvimento auto-sustentável não para cairmos numa autarcia egoísta. Quisemos sim consolidar uma autonomia económica que resultasse da nossa própria autonomia de pensar para pudermos ser solidários livremente".
Esta aposta na solidariedade foi surgindo pouco a pouco. Menos na base de discursos teóricos, mais na exemplaridade das experiências práticas. Mais na experiência dum auto-desenvolvimento em que os erros ensinam, do que na arrogância dos especialistas que apropria um saber apenas para si. Dos pequenos encontros surgiram pouco a pouco encontros mais amplos. Pierre Rabhi, um especialista internacional do desenvolvimento ecologicamente sustentado, prontificou-se a vir falar numa festa onde não faltou música celta e montagem arquitectónica de "domes" e "zomes" como futuras formas geodésicas de construções. E assim, outras pessoas da vizinhança foram-se ligando a esta rede de aspirações e interesses. Outros ainda vieram de mais longe em busca de terrenos e casarios velhos para aí instalarem o embrião desta eco-aldeia em Moisdon la Rivière.
3. No Porto, um grupo de amigos juntou-se em busca de um terreno não muito longe da cidade. Um projecto de eco-aldeia anda no ar!... Será que isso interessa a mais gente?
Se estiveres interessado contacta para a redacção do jornal ou através do e.mail: pagina@mail.telepac.pt
António Jacinto Rodrigues (Professor Catedrático da Faculdade de Arquitectura da Universidade do Porto)
In Jornal "a Página" , ano 9, nº 94, Setembro 2000, p. 10.